quinta-feira

Não somos homofóbicos

Por Reinaldo Azevedo 

Vamos criar um pouco de confusão?  Ultimamente, só o Caetano Veloso demonstra alguma disposição para o debate, hehe.
Há homofóbicos no Brasil, mas é evidente que este não é um país homofóbico, que repudie gays ou a subcultura gay — o “sub” aqui não quer dizer “inferior”, viu, gente! Refiro-me apenas a um conjunto de valores de um grupo que compõe os valores mais gerais da sociedade. Homossexuais estão na política, na universidade, nas novelas, nas revistas de celebridade, em todo canto. A parada gay brasileira, parece, é a maior do mundo. Clodovil e Dener eram figuras de destaque em plena ditadura militar. Um gay, já lembrei aqui, venceu um dos BBBs e pode chegar agora à Câmara dos Deputados (há um pendenga no TSE aí…). No programa de TV, a chacota de alguns machões lhe foi providencial. Na primeira vez em que foi para o paredão, Pedro Bial lhe perguntou se ele imaginava o motivo: “Acho que é porque eu sou gay”. Selava ali a sua vitória.
Como sabemos, ninguém é contra a discriminação em si — a discriminação negativa faz as vítimas; a positiva, os vitoriosos e, às vezes, até os inimputáveis. Lula é o caso: “Eles me discriminam porque sou operário e não sei falar inglês!” É mentira, mas funciona. A partir daí, ele pode falar em português todas as besteiras que lhe vêm à cachola. Os cretinos preconceituosos mal sabem que são os principais aliados da indústria da reparação e do vitimismo triunfante.
Já chamei aqui o PL 122 de “AI-5 gay”. E é mesmo! Há barbaridades flagrantemente inconstitucionais contidas no projeto. Não repetirei argumentos. Algumas bestas quadradas tentaram qualificar meu texto como homofóbico, especialmente aqueles incapazes de ler o que está escrito. Levariam pau no exame de leitura do PISA, aquele em que o Brasil do Apedeuta voltou a dar vexame. Todo mundo tem lá seus preconceitos, não é mesmo? Se você, leitor, é um conservador, por exemplo, sabe bem o que significa ser alvo do rancor dos progressistas, por exemplo…
Mais de uma vez, já me disseram algo como: “Ah, diga a verdade: você diz que é católico só para escandalizar as pessoas, né? Como um ser racional pode ser católico?”. E eu juro que são abordagens que procuram ser simpáticas, sem nenhuma carga de… preconceito! Naquele texto, defendi a união civil de homossexuais e a adoção de crianças por pares gays — desde que tenham comprovadas condições psicológicas e financeiras para tanto. Muita gente reclamou por isso também. Fazer o quê? Não! Não o fiz para “provar” que não sou homofóbico. Eu não tenho de provar porcaria nenhuma pra ninguém e não me rendo a patrulhas! Escrevo o que acho que tenho de escrever. Não entregarei os meus direitos constitucionais à arbitragem de minorais organizadas que acreditam poder mais do que a lei.
Em julho, viajei com a mulher e as filhas para Nova York. Fomos em busca do aquecimento regional, hehe… Aproveitamos para ver A Gaiola das Loucas na Broadway, no Longacre Theatre, uma sala pequena, que tem uma história interessante. O dono também tinha um time de baseball. Vendeu seu principal jogador para sustentar o teatro… A América, se me permitem, é show de bola! É uma peça gay.  Um grande espetáculo! Mas volto ao ponto. Devo ter alguns preconceitos, mas não esse. Foi uma noite divertidíssima. Também fomos rezar — três de nós ao menos; uma das moças, tudo indica, é agnóstica (”que pai é você, Reinaldo?”) — na St. Patrick’s Cathedral, ou Catedral de São Patrício. Não fui me penitenciar de nada, não! A graça da vida está na diversidade e na pluralidade, desde que não se justifique o mal —  a justificação do mal, esta sim, é o verdadeiro reacionarismo, seja você branco, preto, gay, hétero, gordo, magro, corintiano ou flamenguista.
Pressão do lobby
A pressão do lobby da militância gay, no entanto, para caracterizar o país como homofóbico — assim como o Estatuto da (des)Igualdade Racial procurou torná-lo racista — é gigantesca. Nos dos casos, a imprensa entra como grande aliada da causa. Na Folha de hoje, Laura Capriglione, a minha musa das enchentes (está chegando a hora de ela tirar as galochas do armário) conta o caso do Centro Acadêmico da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre.
O busílis é o seguinte: duas chapas disputaram a eleição: por 112 votos a 81, venceu uma em que dois dos cinco membros são assumidamente homossexuais — afinal, este é um país que tem homofóbicos, mas que não é homofóbico, certo? Ou como explicar a vitória? Reproduzo agora um trecho da reportagem da minha musa, que trata de alguns e-mails que circularam na universidade:
(…) um estudante comentava a vitória da chapa 2:”"AAAAAiiiii! Chapa 2! Agora, teremos clericot, serviço de manicure, serviço de pedicure e muuuuita purpurina.”
Logo, um estudante do 5º ano entrou na conversa. Defendeu o clericot, uma espécie de sangria (vinho, frutas e bastante gelo). “Todo mundo gosta de clericot”, escreveu para pontuar que não se trata de bebida gay.
A conversa, à qual a reportagem da Folha teve acesso, subiu de tom. O coordenador eleito Igor Araujo defendeu o direito básico “de não ser agredido gratuitamente por gente mal resolvida”.
Logo, entrou e-mail de outro aluno do 5º ano, xingando e comentando detalhes anatômicos em termos impublicáveis.
Mas foi à 1h18, madrugada do dia 25 de novembro, que se publicou o e-mail mais raivoso. “Numa falsa busca por igualdade e respeito, esses lambedores de p. alheios tentam em vão nos convencer de que é inevitável o futuro rosa, amparado pelo (…) preconceito às avessas contra aqueles que bravamente se levantam contra a ação gayzista. (…) Está na hora de unirmos forças e, veladamente, fazer o que nos couber para dar fim -pouco a pouco- nesta peste. No momento da consulta [médica oferecida pela faculdade] de uma bicha, ou recuse-se (pelos meios cabíveis em lei), ou trate-os ‘erroneamente’!!!”.
Pois é…
As pessoas têm o direito de não gostar da eleição de gays para o Centro Acadêmico? Tem, sim! Piadas estúpidas são feitas o tempo todo em todo canto do mundo? Sim! A Internet facilita a sua difusão.  Nem por isso se vai agora fazer uma lei especial para proteger cada comunidade que se considere atingida por palavras, especialmente quando as leis em curso no país já dão conta de coibir e punir os crimes. Os menores que agrediram aquele rapaz na Avenida Paulista, por exemplo, estão recolhidos à Fundação Casa. Ninguém precisa de uma PL 122 para coibir a violência.
O que não é possível é tomar a manifestação daquele último brucutu a que se refere a reportagem como evidência de uma “homofobia nacional”, que precisa ser coibida pela tal lei. E o mesmo se diga sobre as agressões que ganharam notoriedade nos últimos dias. As leis que temos são mais do que suficientes para punir os agressores. Ora, se cada mensagem agressiva que circula num ambiente restrito — no caso, trata-se de um grupo, que precisa de senha para ter acesso a ela —virar um símbolo, então será preciso importar tecnologia política chinesa para uma varredura na Internet. Faremos leis para punir a discriminação de gays, mulheres, negros, gordos, magros, míopes, pobres… — e até, se for o caso, de heterossexuais brancos e cristãos, que estão no último degrau dos seres desprezíveis, ainda que não abram a boca. Há quem os considere naturalmente propensos à discriminação, mas não se deve ver nisso um preconceito, claro…
Vivemos a era que um acadêmico já classificou de “Sociedade da Reclamação”. A mesma Folha informa:
“Uma faculdade particular de Teresina (PI) anunciou a demissão de um professor substituto depois que ele aplicou uma prova com artigo ofensivo a homossexuais. Cerca de 30 estudantes de serviço social da Faculdade Adelmar Rosado deixaram a sala por causa do conteúdo do texto, na segunda-feira. O artigo, sem assinatura, é contrário à aprovação de projeto sobre a união civil homoafetiva. Um trecho diz que a relação sexual entre pessoas do mesmo sexo ‘contraria a ordem das coisas’.
(…)
A aluna homossexual Narailka Yasmin Soares e Silva, 20, disse que ficou chocada, principalmente ao ler o último parágrafo - onde se justifica que homossexuais não podem expressar o amor, pois a relação sexual é feita “no mais puro estilo animal”. Alguns alunos pediram a anulação da prova, conforme Liana Santanna, colega de turma de Narailka. Mas Fortes [o professor] mandou a turma se calar, segundo Liana. Narailka disse que começou a tremer, passou mal e saiu da sala. Foi então acompanhada por outros colegas.”
Como se vê, ninguém precisa do PL 122 para garantir a vitória de uma chapa com gays assumidos numa universidade ou para cavar a demissão de um professor. O que se pretende? Botar na cadeia uma pessoa que considera a união homossexual antinatural? Por quê? Como prova de que esses militantes querem uma sociedade… tolerante? Ora… Os dois eventos provam a absoluta desnecessidade da lei. Mas não seria eu se não fizesse aqui uma observação à margem: um professor que apresentasse um texto que advogasse, sei lá, a natural bissexualidade do ser humano ou certa inclinação homossexual reprimida em todo heterossexual não seria demitido, certo? O primeiro heterossexual que protestasse correria o risco de ser acusado de… homofóbico.
Encerro
O lobby pela aprovação do PL 122 está com tudo! As reportagens dando conta de discriminação trazem a fala de um militante favorável à aprovação da lei — que é flagrantemente autoritária à medida que, sob o pretexto de proteger minorias, restringe a liberdade de expressão e de culto religioso, igualando opinião e convicção a agressão física. Cria-se o alarmismo para tentar emplacar o texto. Pinta-se um país muito pior do que é com o objetivo de atender às reivindicações de uma minoria organizada.
Que os militantes reflitam um pouco — escolher a fúria é fácil! Leiam o tal projeto. Relacionar-se com gays passaria a ser uma coisa tão perigosa (já que quem vê gay não vê caráter, certo?) que a lei tenderia a causar mais discriminação. Ora, a contratar um homossexual e correr o risco de ser acusado de homofobia se precisar demiti-lo (a denúncia poder feita até por uma ONG), há uma possibilidade de o empresário fazer uma escolha mais “segura”.
Não chegaremos ao ponto ótimo da educação e da civilidade agredindo direitos fundamentais para garantir… direitos fundamentais!

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